A Mais-Valia e a Desigualdade Social



  1. Nas várias formas de organização humana que presenciamos ao longo da história sempre houve desigualdades entre as pessoas, mas qual a origem da desigualdade social humana? Analizemos as formas de organização humana ao longo da história.

  2. Desde que o ser humano começou a se organizar em tribos primitivas que existe desigualdade entre seus membros e enquanto o ser humano estiver na terra possivelmente existirá graus de desigualdades.

  3. No Egito antigo os faraós eram a personificação da divindade suprema e a ele era encarregado o dever de administrar tanto religiosamente quanto politicamente o Império e, a partir daí, era determinada a dinâmica social com os privilégios à classe dominante: o Faraó, sua família e seus aliados políticos e religiosos; os marginalizados desses grupos eram serviçais ou escravos que – grosso modo – não possuíam direitos, a não ser o de servirem ao Faraó.

  4. Neste modelo egípcio de organização humana as desigualdades são latentes e o que é pior, é que essa estrutura social e política era justificada pela religião, ou seja, a religião como instrumento de dominação social; a dominação religiosa não foi latente somente no Egito antigo, mas no período medieval, como veremos mais adiante.

  5. Toda dinâmica social grega era baseada na escravidão, reproduzindo, assim, desigualdades na forma de organizar as cidades; na Grécia antiga somente uma pequena parcela da população – por volta de cinco mil pessoas - era considerada cidadã. Dois grandes e importantes filósofos que fundaram o pensamento ocidental e que contribuíram com a desigualdade social grega foi Platão e seu discípulo Aristóteles.

  6. Platão - nos diálogos o “Político” e na “República” - defende um governo monarca, logicamente como figura central o rei, não qualquer rei, mas o filósofo, ou seja, um rei-filósofo, essa tese do rei-filósofo exclui todos os outros da vida política; respeitando a grandiosidade e a profundidade do pensamento platônico, penso que a única idéia que poderíamos aproveitar seria a de que o rei-filósofo governaria com boas leis escritas:

    “ESTRANGEIRO - Que a massa, qualquer que seja, jamais se apropriará perfeitamente de uma tal ciência de sorte a se tornar capaz de administrar com inteligência uma cidade e que, ao contrário, é a um pequeno número, a algumas unidades, a uma só, que é necessário pedir esta única constituição verdadeira (...) Muito bem. A monarquia unida a boas regras escritas a que chamamos leis, é a melhor das seis constituições, ao passo que, sem leis, é a que torna a vida mais penosa e insuportável.”

    (PLATÃO, 1972: 254; 259. Grifo meu).



  7. Aristóteles também segue as idéias de seu mestre justificando a escravidão dizendo que uns nascem para mandar e outros para serem mandados é a chamada escravidão natural:

    “O homem, segundo a natureza, é aquele que é bem constituído de alma e de corpo (...) o macho é evidentemente superior à fêmea: a espécie humana não é exceção (...) todos os que não têm nada melhor para nos oferecer do que o uso de seus corpos e de seus membros são condenados pela natureza à escravidão (...) é naturalmente escravo aquele que tem tão pouca alma e poucos meios que resolve depender de outrem (...) Ademias há homens feitos para a liberdade e outros pra a servidão, os quais, tanto por justiça quanto por interesse, convém que sirvam.”

    (ARISTÓTELES, 1998: 13; 14. Grifo meu).


  8. Segundo Aristóteles àqueles homens que possuem pouca alma são naturalmente condenados a escravidão, mas como saber a quantidade de alma de cada homem? Outro questionamento que fazemos é que “alma” é uma construção humana é um conceito humano e não um ente natural. É interessante notar que as idéias platônico-aristotélicas ao longo da história foram reproduzidas, mas com outras roupagens.

  9. No medievo a servidão, que é um tipo de escravidão, era justificada pela Igreja Católica dizendo que o trabalho dignifica o homem e que os homens deveriam sofrer na terra para no céu ter a recompensa, ou seja, suportar o sofrimento na terra para alcançar o reino dos céus. A novidade que o corolário católico nos trouxe é a idéia de que todos somos iguais perante Deus – segundo as Sagradas Escrituras -, mas essa igualdade permaneceu somente na teoria das sagradas escrituras:

    “Então, Pedro tomou a palavra e disse: ‘Em verdade, reconheço que Deus não faz distinção de pessoa, mas em toda nação lhe é agradável aquele que o temer e fizer o que é justo. (...) Este é o Senhor de todos’”
    (Atos 11, 34-35. Grifo meu).


    A Igreja Católica trouxe a liberdade e a igualdade entre as pessoas, mas esses direitos só eram possíveis no plano celeste, pois a sociedade medieval era profundamente desigual: o senhor de terras podia tudo e aos servos nada podiam, senão, trabalhar para sustentar a família do senhor e a Igreja.

  10. Percebemos, até este ponto da história, que a massa – o povo – sempre foi escravizada por uma minoria quer seja no Egito Antigo pelos faraós, quer pelos Cidadãos Atenienses, quer pelos Generais Romanos ou pelos Senhores Feudais; junto com esta percepção constatamos, ainda, que sempre houve desigualdades sociais na história da humanidade, até este ponto.
    Se houve desigualdades sociais até a idade média, na modernidade não poderia ser diferente, os antigos servos feudais, agora, passaram à condição de trabalhadores industriais assalariados (proletários), escravo moderno, que eram obrigados a trabalhar até 18 horas por dia nas indústrias capitalistas em condições subumanas.
    Voltemos à pergunta feita no início: “nas várias formas de organização humana que presenciamos ao longo da história sempre houve desigualdades entre as pessoas, mas qual a origem da desigualdade social humana?”

  11. A resposta é simples, esta no próprio ser humano, ou seja, o próprio ser humano que a produz é do agir humano ser desigual, segundo Freud o homem já nasce com um instinto agressivo e com o passar do tempo esse instinto é socializado. Mas essa natureza agressiva e desigual humana não determina em 100% o agir humano, é possível mudar a natureza do homem; a espécie humana é a única capaz de ter consciência de seu agir e com isso raciocinar sobre outros modos de ser humano.
    O capitalismo (um dos modos de ser humano) é um modo de organizar a vida humana, assim como o socialismo e segundo os teóricos do capitalismo o mesmo surge de forma espontânea e natural, mas se analizarmos profundamente – como fez Marx - veremos que o capitalismo não surgiu de forma natural ele cria as condições de sua existência e, por incrível que pareça cria, também, as condições de sua própria supressão.
    Para termos uma idéia, com o surgimento do capitalismo o meio ambiente começou a ser devastado, o efeito estufa agravou-se, os problemas de saúde devido o aumento da poluição agravaram-se, e etc, sem contar que este é um sistema que não visa o bem estar e o “desenvolvimento” humano, mas somente o LUCRO, a qualquer custo, explorando os trabalhadores ao máximo.

  12. Somente a partir da modernidade - devido a tamanha exploração praticados contra as massas - é que esta começou a reivindicar seus direito tanto que o século XX foi o mais revolucionário da história. A “massa” depois de ser escrava e serva acordou para seus direitos e ao lado dela intelectuais como Karl Marx (1818-1883) teoriza a seu favor; esta é outra observação que constatamos: pela primeira vez na história da humanidade que os intelectuais tomam partido dos menos favorecidos, a não ser no caso particular Grego do surgimento da democracia.
    Para Karl Marx, a mais-valia é o capital (dinheiro) que não volta para os trabalhadores em forma de salário – grosso modo - é o lucro do capitalista; a ganância pelo lucro fez com que os capitalistas desenvolvessem formas de aumentar a taxa de mais-valia criando a mais-valia absoluta e relativa.

  13. A mais-valia absoluta ou clássica é aquela que é obtida aumentando a jornada de trabalho e mantendo os mesmos salários, ou seja, explora ao máximo e ainda mais os trabalhadores. Já a mais-valia relativa é aquela que é obtida sofisticando a produção com maquinário (trabalho morto), acrescenta-se máquinas no processo produtivo, produz-se mais mercadorias com a mesma jornada de trabalho e o mesmo salário para os trabalhadores, aumenta a tecnologia da produção para diminuir os custos do trabalho, segundo Marx (1988): “economia do trabalho por meio do desenvolvimento da força produtiva do trabalho (...) seu objetivo é apenas reduzir o tempo de trabalho necessário para a produção de determinado quantum de mercadoria”.
    Como vimos, a origem da desigualdade social não está na natureza humana, pois ela poder ser mudada, a origem da desigualdade social está no ancoramento da sociedade em classes sociais e na mais-valia.

  14. Inspirados em Marx podemos depreender que se existe desigualdade social é porque a sociedade está dividida em classes sociais, a solução é abolir as mesmas ou forçar uma melhor distribuição da renda – “forçar” a melhor distribuição da mais-valia entre quem a produz: os trabalhadores. É preciso ter cuidado com a interpretação do termo “forçar”; como nada se dá de forma espontânea no mundo humano, no fim das contas, seria preciso fazer uma revolução para forçar a distribuição dos lucros.

  15. A sociedade atual almeja a melhor distribuição da renda produzida e a garantia da liberdade individual. A distribuição de renda (mais-valia) no Brasil segundo a ONU (Organização das Nações Unidas) é uma das mais desiguais do mundo ficando, o Brasil, entre os cinco países mais desiguais do planeta. Um dado que revela a urgência da descentralização da renda é que, segundo o UNICEF, 50 milhões de pessoas no Brasil ainda vivem na pobreza apesar dos avanços tecnológicos e do PIB (Produto Interno Bruto - o somatório de todas as riquezas produzidas no país); outro dado assustador é que cerca de 3,5 milhões de adolescentes ainda estariam fora das escolas, os motivos são: violência e gravidez precoce; o documento da ONU aponta vários outros problemas sociais brasileiros, mas o importante é destacar que se existe desigualdade social um dos fatores é a concentração da mais-valia no bolso de 10% da população e Karl Marx estava certo ao teorizar as lutas de classes e a ditadura do proletariado. Se existe as lutas de classes é porque os trabalhadores querem receber melhores salários, ou seja, descentralizar a mais-valia; as lutas de classes - ao longo da história – foram justamente por causa do desejo de distribuir melhor a mais-valia produzida.

  16. Percebemos que os trabalhadores, ao longo da história, lutaram pela redução da jornada de trabalho, melhores condições de serviços, carteira assinada, etc, agora, a luta mais difícil a ser travada é pela socialização da mais-valia, ou seja, diminuição das desigualdades sociais, pois, quando dividirmos a riqueza produzida é que teremos reduzido as disparidades sociais. Concluímos que a natureza humana não é o fator decisivo para que haja desigualdades sociais, pois a mesma pode ser mudada, isto que define o ser humano: mudar constantemente sua natureza racional. Concluímos, também, que se continuarmos do jeito que está – com o capitalismo explorando e poluindo cada vez mais os recursos naturais - daqui há alguns anos o planeta não suportará é preciso um sistema que vise mais o bem estar humano e da natureza e o sistema econômico e político menos agressivo tanto para o bem estar do homem quanto para a natureza seja o socialismo.

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